5 Perguntas Para o enólogo Luís Henrique Zanini

O rótulo do Era dos Ventos Peverella, com um poema do enólogo – Foto de Bruno Agostini

“Vivemos aos encontros do abandono / Sem verdade, sem dúvida nem dono / Boa é a vida, mas melhor é o vinho” – Fernando Pessoa. Aqui o link para o poema completo.

“Deveis estar sempre embriagados. Aqui reside tudo. É a única questão. Para não sentir o horrível fardo do tempo que vos esmaga os ombros e vos verga para a terra, é imperativo embriagar-se sem descanso. Mas de quê? De vinho, de poesia ou de virtude, a vosso gosto. Mas embriagai-vos.” – Charles Baudelaire.

O argentino Jorge Luis Borges escreveu o soneto do vinho, que não vou reproduzir aqui (deixo esse link, em português e espanhol).

Já o chileno Pablo Neruda fez brilhantemente uma Ode ao Vinho, onde disse: “Vinho cor do dia / vinho cor da noite / vinho com pés púrpura / o sangue de topázio / vinho, estrelado filho / da terra  / vinho, liso / como uma espada de ouro, suave”. Aqui o link, também em espanhol e português.

Na antiga poesia persa, antes de Maomé “proibir” o consumo de álcool (há controvérsias nisso), o vinho era tão relevante que esse tema era dividido em três subcategorias: místico, verdadeiro e literário (daria para fazer um livro sobre isso, mas vou só deixar um link para quem quiser se aprofundar no assunto: em inglês).

Shakespeare praticamente bebia pouco vinho, porque era muito caro na Inglaterra de seu tempo. Mas sabe-se que era um apaixonado por Jerez, que regava as noites em umas de suas tavernas preferidas.  E muito escrevia sobre ele: “O bom vinho é um camarada bondoso e de confiança, quando tomado com sabedoria.”

Um dos livros mais conhecidos de Charles Bukowski chama-se  “Pedaços de um caderno manchado de vinho”.

Vou parando por aqui, porque isso é só uma reportagem, e não um livro (seria fácil fazer um sobre o tema, tão vasto, profundo e agradável).

Já escreveram que o vinho é a poesia engarrafada.

Eu vou além. A poesia é dádiva do vinho.

A Lua que me desculpe, mas a grande inspiração dos poetas ao longo da nossa História não foram astros, mas o vinho.

Zanini acaricia as uvas da Vallontano – Foto de Bruno Agostini

Para inaugurar a coluna “5 Perguntas para…” eu escolhi o enólogo Luís Henrique Zanini, uma pessoa especial – que escreve vinhos e vinifica poemas.

Isso explica as razões de Zanini ser um dos enólogos mais admiráveis que conheço: ele também é poeta, e seus escritos muitas vezes estão estampados nos rótulos dos vinhos que produz, em seus dois projetos: a Vallontano e a Era dos Ventos.

O vinho é a mais nobre expressão do mundo das plantas. A poesia é a mais nobre expressão do mundo dos homens.

Zanini com seus sócios na Era dos Ventos, Pedro Hermeto e Álvaro Escher: legítimo vinho de garagem – Foto de Bruno Agostini

Essa minha admiração me fez escolher o Zanini para a inauguração dessa coluna dominical “5 Perguntas”, na qual vou trazer a opinião de profissionais que eu muito admiro no mundo da gastronomia (para mim, enogastronomia é redundância, palavras inexistente e desnecessária, pois gastronomia já envolve o vinho: aliás, em breve escrevo sobre um tema controverso. Culinária é uma coisa, gastronomia é outra, um pouco mais abrangente).

Zanini e suas uvas passificadas, no processo igual ao do italiano Amarone – Foto de Bruno Agostini

MA: Quando e como começou a se interessar por vinho?
Zanini: Meu primeiro contato com o vinho foi quando criança  na casa de meu avô paterno, lembro que a bebida fazia parte dos encontros da família ,  e eu e meus primos bebíamos  vinho, com um pouco de água e açúcar. Mas meu interesse mesmo  por vinho começou em 1998, ano que comecei a execução do projeto da vinícola  Vallontano, juntamente com família da minha mulher Talise,  foi um desafio imenso, e ao mesmo tempo a certeza de que o meu caminho era esse.

MA: Qual o seu estilo de vinho preferido?
Zanini: Gosto de vinhos autênticos, não padronizados,  com mínima intervenção possível, gosto de vinhos de pequena produção, de vinhos limpos sem maquiagem.

MA: Qual o melhor restaurante que já foi?
Zanini: que pergunta difícil Bruno,  fora do Brasil com certeza o Caminetto d’Oro em Bologna, aqui no Brasil seria uma injustiça citar apenas um lugar diante de tantos lugares maravilhosos que frequentei.

MA: No Brasil, sem falar na Vallontano, quais vinícolas você mais gosta?
Zanini: Era dos Ventos (por motivos óbvios rsrsrsrs), Adolfo Lona, Máximo Boschi, Angheben, são alguns que gosto.

MA: Qual a sua região vinícola favorita no mundo?
Zanini:  Borgonha, lá vivi intensamente o vinho!

Concordando em relação à Borgonha, eu só acrescentaria o Piemonte (italianófilo que sou).
Deixo uma dica: provem os vinhos do Zanini. A linha da Vallontano é vendida pela Mistral, e na minha opinião não apenas são dos melhores vinhos do Brasil, mas apresentam preços imbatíveis (entre R$ 63,90 e R$ 99,50).

Os vinhos da Vallontano – Foto de divulgação

VINHO – Luís Henrique Zanini

E se o vinho quisesse, assim, inesperadamente
Transfigurar-se
entre um raio de luz e lucidez?
E se onipotentemente presente,
metaforicamente eloqüente
parisse  aos quatro ventos
O hálito do seu grito?
rasgaria apologias indefiníveis. Infalíveis,
Como um grande inquisidor, entre Dioniso e Dostoiévski,
perturbaria tua razão:
“Não quero a foto quero a luz,
não quero unhas pintadas, quero-as quebradas,
não quero pele maquiada quero  tez queimada,
sem boca pintada,
sem adorno em teu corpo,
quero abrigo em alma  plena, sedenta…
quero ser livre no espaço do abraço de teu cansaço.
Fala-me com os sulcos das tuas mãos que envelhecem
E completa-me com o teu olhar ouvindo o outono de Vivaldi,
procura em mim teu segredo e teu amor embriagado
Cria-me nas constelações que te viram nascer ou na loucura de uma pintura impressionista,
Só não me deixe morrer na taça e nas entranhas de um esnobe,
Liberta-me desta vassalagem onde quem ostenta diz que me possui,
Sou terra, chuva, vento e tempestade, sol e sais, metais, fusões imaterias, sou a poesia tatuada em tua loucura diária. O que buscas? Despedidas?
Sou o parágrafo mais puro, neste inexplicável livro da tua vida.

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Para encerrar, deixo links que julgo relevantes a respeito do Zanini.

Encontro Mistral: Zanini – Por Didu Russo.

Peverella: o início, o meio e o futuro – Por Eugênio Oliveira

O que distancia a Vallontano da Era dos Ventos – Por Didu Russo.

Era dos Ventos surpreende em Paris (tem um poema dele aqui) – Por Eugênio Oliveira.

Champanhe, por Luís Henrique Zanini

Vertical do Cabernet Sauvignon da Vallontano – Por Álvaro César Galvão

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