Deu no New York Times: 8 maneiras pelas quais os restaurantes mudaram na década passada

O sanduíche de ovo: de Los Angeles para São Paulo – Foto de Bruno Agostini

 

Com o título “As 8 maneiras pelas quais os restaurantes mudaram na década passada”, o crítico gastronômico do NYT fez uma reportagem que começou com uma pergunta no Twitter: “OK, todos os meus amigos da mídia gastronômica: mas que diabos foi a década passada nos restaurantes?” .

Ótima pergunta, e o resultado foi um balanço para lá de interessante.

Ao ler percebi que no Brasil as coisas aconteceram de forma bem parecida. Quase igual. Acho que praticamente no mundo todo.

Vejamos.

Chicago Style Pizza: em foco – Foto de Bruno Agostini

1 – Comemos com câmeras
O primeiro tópico é mais que óbvio. Instagram e Youtube, em especial, fizeram com que quase todos fotografem e filmem seus pratos. Deu exemplo da influência da imagem, falando do sanduíche de salada de ovo, do Konbi, em Los Angeles (que virou moda por aqui também). Eles escolheram essa foto para ilustrar a reportagem, e eu fiz igual. Lá como aqui, os chefs estão entre os maiores usuários – e, assim, podem falar diretamente com o público, apresentando os seus pratos e produtos, sem precisar passar pela mídia, que nem sempre é honesta (na verdade ele até mete o pau). As pessoas, hoje, escolhem por conta própria onde comer, sem precisar ir atrás de críticos. Lado ruim: muitas ideias copiadas. Igualzinho aqui, não?
Sobre isso, basta lembrar do icônico bolinho de feijoada de Katia Barbosa, do Aconchego Carioca, lançado em 2008, acho. Em 2010 já estava disseminado por todo o país, e hoje parece não haver bar e botequim sem um desses no menu (fora que criou a tendência irreversível de transformar pratos clássicos em bolinho – com resultados nem sempre bons: melhor comer o prato como ele é mesmo).

2 – Os pratos diminuíram
“Em restaurantes como Estela e Wildair em Nova York e centenas de outros em todo o país, o novo paradigma significava que poderia ser difícil dizer se você estava em um bar de vinhos, um bar de tapas, algum outro tipo de bar ou mesmo aquela instituição antiquada conhecida como o restaurante”, escreveu ele.  Novamente a história se repete por aqui, e nem preciso listar os bares de tapas, gastropubs e casas especializadas em pequenas porções e pratos para compartilhar.

3 – A vingança dos veganos
Ao “assassinarem” o prato principal, diminuiu a quantidade de carnes, peixes etc nos pratos, e muitos chefs passaram a explorar fortemente os vegetais (Rafa Costa e Silva que o diga), que são estrela em muitas receitas. Fora as casas vegetarias e veganas, que multiplicaram-se (e hoje não há restaurante sem pratos dos gêneros).

“Então, no final da década, outro arranjo de palavras começou a adquirir poderes misteriosos: “baseado em plantas”. Isso vale para os nossos burgers e bifes veganos. Não tem jeito, temos que respeitar, cada um come o que quer. E, novamente, o fenômeno se dá por aqui também.

4 – A febre dos food halls
Aqui, ainda bem, não adotamos o nome food hall, e usamos um termo bem mais simpático que pátio de comidas. Aqui usamos expressões como “espaço colaborativo”. Aqui a coisa começou a pegar há pouco tempo, e o primeiro exemplo que me vem à cabeça é o Be + Co, também chamado de “vila gastronômica”, em Botafogo, para mim uma das grandes novidades de 2018, que só melhorou em 2019. (Adoro o termo “vila gastronômica”, tudo a ver com Botafogo.)
Embora seja tendência aqui (logo abre um espaço desses na Praça da Bandeira), este tópico para mim é o único que não se repetiu aqui igualzinho, igualzinho.

5 – Foi uma década de ruptura para os chefs negros
Novamente a história se repete aqui. Ele usa o exemplo de chefs como JJ Johnson, da sua Nova York, e Edouardo Jordan, que despontaram no período. Isso também significou a valorização da cultura gastronômica de raízes africanas. Poderia dar tantos exemplos. De João Diamante a Ícaro Rosa, passando por Kátia Barbosa e filha, Andressa Cabral. E assim, abriram recentemente restaurantes como a Casa Omolokum, no Centro, da chef Leila Leão e o Afro Gourmet, no Grajaú, da baiana Aline Chermoula. Há de se destacar a presença feminina neste mercado.
Aguardem os próximos anos. O Le Cordon Bleu carioca vai jogar no mercado muitos e muitos chefs negros, oriundos de comunidades carentes (é um lindo trabalho). Que bom.

6 – Tratamento ético não é só para animais
“Algo deu grotescamente errado quando os chefs se gabam de que as galinhas que compram tiveram uma vida feliz e sem estresse, mas não podem nos prometer que as mulheres que empregam não estão sendo agredidas no depósito ”, escreveu Pete Wells.
Nada a acrescentar, mas a verdade é que isso está mudando.  Até porque, destratar funcionários é algo muito, mas muito grave – por mais estressante que seja o ambiente na cozinha.

7 – O futuro parecia sombrio
Aluguéis mais altos, impostos, a chegada de serviços de entrega (mais Netflix etc)… Lá, assim como aqui, na última década muitos restaurantes tradicionais fecharam, e vimos chefs renomados sem conseguir sustentar seus restaurantes, e precisando fechar as portas, e com dificuldade de voltar ao mercado. Assim como aconteceu com o jornalismo, as faculdades colocaram no na rua (muito) mais profissionais do que o mercado pode suportar.

8 – E, no entanto, parece haver bons restaurantes em quase todos os lugares
“Enquanto algumas pessoas previam a desgraça, mas muitas outras estavam dizendo que o nível de restaurantes em todo o país nunca foi tão bom”. Isso é verdade. Os bons bares e restaurantes do Rio se concentravam na Zona Sul, e hoje estão espalhados por toda a cidade, com destaque para a Tijuca e a Barra. Fora os preços. Temos vários restaurantes inaugurados de uns oito anos para cá com perfil mais econômico. E veio a crise: assim, praticamente todo restaurante da Zona Sul hoje tem almoço executivo com preços entre R$ 39 e R$ 59. O Zuka, por exemplo, da chef Ludmila Soeiro é um ótimo exemplo. Por R$ 55 ela serve entrada, prato principal e sobremesa. E ela cozinha muito, e ao acompanhar seu Instagram, salivo com os pratos do executivo. Almoço em restaurante chique nesse preço era coisa impensável há cinco ou seis anos. Muitos desses, com entrada, prato principal e sobremesa. Estão competindo com os botecos e seus deliciosos PFs.

Este post é uma repercussão da reportagem do NYT. Amanhã posto minhas considerações sobre o Brasil – mas com mais ênfase no Rio que é a minha praia (link aqui).

Deixo o link para a reportagem do NYT. 

3 commentários
  1. O food hall da Praça da Bandeira é de um amigo de faculdade, provavelmente em comum. E você não colocou o preço do Zuka.

    1. Grande Jorge Xavier
      . Tinha colocado, apaguei, ia escrever para eles para confirmar, mas esqueci. Obrigado pela lembrança. Abraços

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