Comecei o dia descendo as Ramblas, depois de umas três “copitas” de cava – das minhas preferidas – no café da manhã tardio e preguiçoso na espetacular Mandarin Oriental: era simplesmente a Cava Juvé y Camps Reserva de La Familia Brut Nature.
Não dá para descer a mais emblemática rua de Barcelona sem uma parada na Boquería, que toda a alma da gastronomia local, a boemia, os balcões abarrotados, as vitrines lotadas de gostosuras, o perfume dos fogões.
Naquela confusão matinal se aproximando do meio-dia o balcão do balcão do El Quim, outra entidade da comida local, o bar mais famoso do Mercado St Josef, la Boquería. Sugestivo nome para um lugar onde comer e beber é o que há. Ou, então, se pode, ainda comprar coisas. De comer e de beber.
Mesmo por volta do meio-dia o balcão estava abarrotado, e ainda fila de espera. Rumei para outra joia catalã, perto dali, dica precisa, e preciosa, de um amigo espanhol que morou em Barcelona muitos anos. Ele me disse: “Imperdível. Fica na Carrer Unió . Tem bar e restaurante. Minha dica é ficar no balcão do bar. Você vai gostar.”
Gostar é pouco. Cheguei e como estava sozinho não demorei a conseguir lugar no longo balcão. Coisa de cinco minutos, talvez dez, mas sem a menor pressa, porque já estava tragando um Manzanilla, para clarear as ideias e ajudar as azeitonas ficaram ainda mais deliciosas. Assim eles informam seu horário de funcionamento: “Abrimos de 13h a 24h. Casi todos los días del año, menos los domingos, que cerramos por descanso del personal.”. Eles abrem e em seguida o balcão está assim, lotado. Mas há lugares nas mesas do bonito salão.
Uma vez acomodado, empunhando um branco da região de Penedés que não me lembro qual era, mas que era bom. E começou a festa. Primeiro navajas, depois as Anchoa de Santoña, dessas iguarias que nos fazem quase choras, simples, depois de feita a cura, não muito longa, é servida assim, só com azeite e uma cebolinha francesa – francesa, não, catalão, legítima.
Bem, com as lulinhas salteadas que vieram em seguida vi que ali não tem brincadeira. O cardápio é desses de enlouquecer gente sã cuja loucura é amar a comida. Depois pedi boquerones (um delicioso peixinho curado ao vinagre de Jerez).
Já imaginou o que é papada de porco ibérico com arenque defumado? Pois lá tem. Fiquei tão vidrado que nem tirei foto. Que loucura não seria também as “mollejas de ternera com gambas y su jugo”. Os caras fazem um bechamel de foie gras para cobrir o seu “canelón de pularda (frango especialíssimo)”, muy conhecido. Fiquei tão embasbacado que até esqueci de fotografar. Que coisa mais maravilhosa, uma das melhores massas que já comi na vida.
Os olhos miram aquela lista de delícias e o cérebro diz. Pede, só mais um. Eu parei por aqui, resisti porque a tarde ainda me reservava mais três bares, antes de um jantar da Miguel Torres. Mas foi dureza não pedir “La gamba roja de la playa que llega a las ocho !Salteadita del Mar al plato”. E o que dizer da poética “Presa ibérica a la parrilla com refrito de ajos y limón cortadita fina com su guarnión”? Fiquei curioso pelo arroz Cañete do dia.
E pelas sobremesas Todas elas, que nem vou citar aqui porque acho um tanto indecente falar dessas doçuras.
Não foi fácil sair dali, e desde então sonho em voltar ao bar Cañete, que me veio fortemente à lembrança por esses dias, quando li uma reportagem listando os melhores bares de tapas de Barcelona, abrindo com esta maravilha, e inspirando a estreia oficial da coluna “De Bar em Bar”, uma das dez publicadas semanalmente, todas as terças de noite aqui neste Menu Agostini, uma revista digital de turismo gastronômico e outras delícias”.
SERVIÇO
Bar Cañete: Carrer de la Unió 17, Barcelona. Tel. (932) 703-458. www.barcanete.com