Lembranças de infância na mesa do quarentão Ettore Cucina Italiana, na Barra

 

A lasanha Ettore, de massa verde com presunto, muçarela, ricota e molho de linguiça: afetividade – Foto de Bruno Agostini®

Meus avós se mudaram para a Barra no finalzinho dos anos 1970. Quase nada havia por lá. Um dos lugares que íamos era uma cantina italiana, que era refinada para a época, com sua aparência simples, que misturava paredes de tijolinho aparente, garrafas de Chianti com cestinha de palha, quando com fotos da Itália dessas divulgadas por escritórios de turismo e, se não me falha a memória, toalhas quadriculadas sobre a mesa. Era a Tarantella, e ficava no início da Praia da Barra, perto de um famoso restaurante da época, o Farol da Barra, que tinha uma feiosa réplica do monumento baiano.

Comecei ali na Tarantella a achar a cozinha italiana a melhor entre todas, logo com meus cinco ou seis anos, quando também fui me encantando pela gastronomia árabe (foi o que me levou a escrever sobre o Amir e o Baalbeck, além do Basha, recentemente neste site).

E mais: Baalbeck, o árabe da Galeria Menescal: emoções eu vivi!

Lembro das travessas de barro fumegantes que traziam massas borbulhando, com uns tostadinhos do gratinado. Eu apreciava lasanha verde, que pedíamos muito em restaurantes como o Garden, em Ipanema, que fechou na pandemia, e no Rio Nápoles, na General Osório. E também uma massa à puttanesca, cujo nome despertava a minha curiosidade pelo sufixo que vem do meretrício (o molho teria nascido entre as prostitutas de Nápoles).

O que eu lembro é que eu, e toda a família, gostava de ir lá, ver os garçons, mais engomados que a média, e comer massas.

Daí que desde que o Ettore abriu as portas com a sua rotisseria no mesmo Condado de Cascais onde está hoje, a gente passou também a comprar massas e molhos prontos, para apenas finalizarmos em casa, geralmente no forno. Era dos mesmos donos da Tarantella, e tinha uma boa qualidade, com preços atraentes, eu me recordo dos comentários dos familiares.

Faço muito isso: revisitar lugares que frequento há tempos, como manutenção da memória afetiva. Já lembrei dos libaneses de Copacabana, mas tem também a Dona Irene, em Teresópolis, e o BB Sucos, em Ipanema, com o seu sanduíche de filé com queijo Palmira (para ler, clique nos links).

Há cerca de duas semanas resolvi enfim ir comer lá no Ettore, algo que só havia feito uma vez na vida, apesar de minha grande curiosidade a respeito do lugar.

Tinha uma garrafa de vinho na mochila, e perguntei o preço da rolha. Para a primeira garrafa, não cobram. Pedi para abrirem o meu Cabernet Sauvignon da Família Brito, cuja história eu já tratei aqui (neste link).

Mas já tinha certeza do meu pedido, e escolhi este vinho porque imaginei ser adequado ao prato: A lasanha Ettore, de massa verde com presunto, muçarela, ricota e molho de pomodoro e linguiça. O sabor é pura afetividade, para mim. O molho é ralo, e lisinho, alaranjado pela emulsão do azeite com o tomate, tipo o que se fazia antigamente, batendo tudo no liquidificador. A ricota dá mais leveza que o béchamel que muitos usam. A muçarela derrete, o parmesão gratina tostando levemente a superfície. O molho tem sabor ancestral, me lembra da infância, de verdade. A massa verde tem o tom de outrora, e o perfume é de cozinha de cantina, trazendo o cheio de coisas que assam no forno. Aroma de comida de casa, de restaurantes clássicos, de outros tempos vividos e tão vívidos na memória. Porque comer é uma maneira de lembrar.

 

SERVIÇO
Ettore Cucina Italiana: Condado de Cascais, Avenida Armando Lombardi 800, lojas C, D e E, Barra da Tijuca. Tel.: 2493-5611. Instagram: @ettorecucinaitaliana www.ettore.com.br

6 commentários
  1. Olá Bruno. Me identifiquei com esse texto. Comecei a frequentar a Tarantella jß adolescente. Logo virei fã. Era a melhor pizza do Rio. A calabresa vinha de SP. Não era essa porcaria da Perdigão que tem por aí. E sem muçarela, o que é o certo. A partir de 1979 comprei meu primeiro carro e nunca mais saí de lá. Comi quase todo o cardápio. Anos depois vim a saber que o dono Ettore Siniscalchi havia sido dono da Cantina Sorrento no Leme. Anos depois o filho de Ettore abriu o Ettore no Condado de Cascais. Fui bastante, mas nunca chegou ao nível da Tarantella. Deixei de ir e continuei frequentando a Tarantella. O Ettore abriu no final do Leblon mas também não me empolgou.

  2. Olá Bruno, gostaria de saber se você frequentou a pensão da dona Yolanda em Teresópolis, cuja comida caseira foi a melhor que conheci. Infelizmente, ela faliu quando apareceu a comida a Kilo. Abraços

  3. Conheci a Tarantella em 70. Ficava no meu trajeto para Jacarepaguá, onde lecionava. Muitas vezes na volta para casa parava no restaurante para almoçar. Ainda lembro do que normalmente pedia-Canelone de ricota. No início da década de 80 mudei para Barra e a Tarantella fazia parte da nossa rotina de comer fora. As garrafas de vinho Chianti penduradas, assim como as resteas de alho ou cebola(não lembro bem)… Frequentávamos tb o Ettore no Cascais, mas a Tarantella era sempre a 1a opção.
    Interessante que o outro restaurante citado por vc, tb fez parte da minha vida por décadas, Dona Irene e Sr Miguel em Teresópolis, que frequentávamos tb desde meados de 70, ainda na sua 1a instalação, na própria residência do casal. Que menu delicioso!!!! Lembro que tínhamos que ligar horas antes do horário reservado para fazer o pedido dos pratos.
    Sua postagem me levou de volta a um tempo muito bom da minha vida, cheio de lembranças e memórias afetivas.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *