Em tempos de saudades, sonhei com o Antiquarius

Um sonho com o Antiquarius – Foto de Bruno Agostini

O mundo inteiro está saudoso. Essa noite sonhei com o Antiquarius.

Há uns dez dias decidi jogar a ansiedade de lado, e desde então tenho dormido mais e melhor.

Sonhei que estava lá, nos fundos do restaurante, numa mesa que eu gostava. Apoiei os braços na mesa acolchoada, aquela toalha macia.

O couvert, naquela noite gravada na memória, escoltado por Laureano. Sempre o Alentejo – Foto de Bruno Agostini

Sem que fosse preciso pedir, chegou o couvert.

Senti primeiro o sabor do queijinho fresco, colocado sobre a torrada mais fina que me lembro ter visto.

Depois, rissoles de camarão e bolinhos de bacalhau, pimenta nos dois, azeite no segundo.  Uma colherada de queijo da Serra da Estrela, um naco de patê, a berinjela…

O salão superior, onde eu gostava de esperar, quando não tinha mesa e o bar estava lotado (aquela ali é a Maria, aos dois anos) – Foto de Bruno Agostini

Tirei uns petiscos da mesa e apoie na vizinha, não uma pessoa, uma outra mesa. Para tirar foto pro Instagram.

Clicava para mostrar aquela beleza. Pensando bem: o couvert do Antiquarius nem é tão monumental. Mas ele é o prenúncio do que virá.

Só tenho memórias lindas de lá, desde a infância até os últimos meses da casa.

“Se chegasse a comer neste sonho delicioso, teria chorado, sem sombra de dúvidas”, pensei enquanto escrevia – Foto de Bruno Agostini

Pensava no que pedir. Perna de cordeiro à moda de Braga, com feijão branco, tinha a liderança, frente a tantos bacalhaus memoráveis.

Uma das três panelas do cozido: morcela, farinheira, língua defumada, peito de boi, rabada… – Foto de Bruno Agostini

Não era domingo, porque se fosse eu iria no cozido, certo.

Lembrei do picadinho e dos escalopinhos ao roquefort que pedia na infância. Mas, não, desta vez, não. Sabia que era uma despedida.

“Camisa 10” ou “Camarões à Zico”, a rigor, um petisco ibérico: “gambas al ajillo – Foto de Bruno Agostini

Camarões à Zico, seriam evidentemente pedidos como entrada.  Chouriço na bagaceira? Aceito.

E que tal bochechinhas de javali com favas verdes?

Me deu uma agonia… Como posso esquecer do arroz de paro?!?!?! Fiquei chocado.

O vinho seria Alentejano. Mouchão com certeza eles têm. Mas será que a adega guarda algum Tonel 3-4 antigo?

Seleção de doces, neste caso, com Tawny 20 anos – Foto de Bruno Agostini

Será que vão ter um bom Madeira para a sobremesa?

Refletia sobre o cardápio, que é igual a vida: feito de escolhas.

– Traz mais uma reposição do couvert? – Foto de Bruno Agostini

Quando voltei à mesa, já não tinha mais couvert. Tinha acabado. Como de praxe, solicitei reposição, dos bolinhos de bacalhau e dos rissóis.

Antes que chegassem, eu acordei.

Em tempos de crise virológica, em vez de ficar triste com o corte abrupto, fiquei feliz e aliviado. Não precisaria pagar a conta.

 

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