Bacalhau não é peixe, como dizem os portugueses. É mesmo um ingrediente não só versátil e delicioso, mas também muito parti cular – até polêmico.
E uma das perguntas que mais escuto em relação a harmonização de vinhos e comida – até porque temos hábito de consumo do Gadus Mohua e suas variações mentirosas (e, por mim, dispensáveis, incluindo o Gadus Macrocephalus: é tudo apenas pescado salgado seco) – é essa: bacalhau vai melhor com branco ou com tinto?
A resposta tenho na ponta da língua, e já pratico o desafio há mais de 15 anos: para mim, tanto faz se é branco ou se é tinto, mas que seja um vinho português, e de preferência do Dão. Funciona também com rótulos de Lisboa e do Alentejo, da Bairrada e do Douro, e também com os vinhos verdes, de várias matizes. Já provei bacalhau com vinhos de todo o mundo, e essa harminização também já deu certo com vinhos brasileiros mais leves e menos alcoólicos, com a linha Almadén, da Miolo, das grandes escolhas em termos de custo-benefício em nosso mercado. Por outro lado, é preciso alertar: é bom evitar vinhos muito tânicos: já fui vítima de harmonizações desastrosas com exemplares chilenos e argentinos, e até mesmo com vinhos “parceiros da boa mesa”, como um bom Chianti Classico.
Na dúvida, vá no Dão. Tanto faz se um Encruzado ou um tinto, seja um Touriga Nacional 100%, seja em cortes com outras uvas locais, como Jaen e Tinta Roriz). No caso de receitas baseadas no azeite, eu tendo a gostar mais dos tintos. Porém, nas versões cremosas, como o português bacalhau espititual, ou o italiano baccalà mantecato com polenta, eu vou quase sempre preferir os brancos feitos com a uva Encruzado. Como o excelente Quinta dos Roques, que se não me engano foi o primeiro Encruzado que bebi (ou menos, que me fez prestar atenção a essa uva de maravilhosa expressão, de sua casta e sua região).
Vinhaço, com estrutura, equilíbrio e profundidade, com precisos 13% de álcool. E o que isso quer dizer? Que é untuoso e ao mesmo tempo fresco, amanteigado e cítrico; é elegante no perfume e na boca, com álcool, acidez e corpo em perfeita harmonia, e tem um final longo e persistente. E ainda por cima é um vinho “glou glou”, desses que descem fácil, e quando vemos a garrafa já acabou – especialmente se estamos à mesa, comendo bacalhau.
Custa R$ 221,10 no site da importadora, a Decanter.
Provei esse vinho pela última vez ao lado do amigo Celio Alzer, das opiniões mais respeitáveis neste universo, que resumiu: “É o melhor Encruzado que temos por aí, que belo vinho”, disse.
Concordo, mestre.
SERVIÇO
Encruzado Quinta dos Roques Dão: R$ 221,10 no site da Decanter.
Encruzado Quinta dos Roques Dão: R$ 221,10 no site da Decanter.