Saí flutuando depois do jantar no Oteque, feliz e impressionado. Com uma certeza: inaugurada em janeiro a casa do chef Alberto Landgraf marca definitivamente a sua entrada no time dos grandes cozinheiros do Brasil. É a grande novidade do ano não só no Rio, mas no país.
Vai faturar estrela Michelin. E aposto que esse reconhecimento virá através de outras premiações. Eu escrevo desde já, depois de duas visitas. Uma em fevereiro, ainda no começo, que já foi um jantar espantosamente perfeito; e outra na semana passada, cuja a memória ainda não conseguiu digerir, ainda bem.
Minha melhor refeição no ano, o que não é pouca coisa. Como se fosse um concerto seguiu um ritmo compassado, entre momentos de tensão e relaxamento, acompanhado pelo serviço que seria discreto se não fosse tão preciso no movimento das taças, no manuseio das garrafas e na escolha das bebidas. Posso dizer que conto nos dedos os lugares com serviço impecável no Rio, e o Oteque entrou para essa lista que cabe numa mão. A parte dos vinhos é capítulo à parte, pela seleção, harmonização (essa palavra chata mas cujo o efeito quando acertado é sublime) e – parece bobagem, mas não é – as taças, bonitas, leves e delicadas, de bordas finas, que valorizam a bebida. São da marca Zalto, têm o nome do restaurante gravado, e no Rio só o Cipriani tem iguais, e mesmo assim são exclusivas da mesa do chef (Ed Arruda, sommelier do Copa, me disse que custam R$ 400).
Voltemos à mesa. Numa mesma refeição eu provei alguns dos melhores pratos do ano. Tem sido cada vez mais difícil definir a comida de um grande cozinheiro que trabalhe com cardápios de autor. (já escrevi aqui, recentemente, sobre o Lasai, outro exemplar disso, e o Cipriani, no Copacabana Palace, idem).
Como traduzir em palavras a grandeza de um prato, como aquele que combina um brioche impecável, ligeiramente tostado, fofinho por dentro e crocante por fora; com uma bela fatia de foie gras e meia sardinha marinada?
O pão acomoda o figado de pato, que por sua vez recebe o peixe, impecavelmente limpo, sem nenhuma espinha sequer, trabalho árduo da cozinha, que se limita a cinco unidades por dia (ou seja, dez porções, e só). Fui um dos felizardos daquela noite, que teve uma sequência de vinhos, e um serviço de salão, incluindo taças de uma leveza incrível, explicações precisas e sem embromação sobre cada rótulo, e uma louca que é pura lindeza e que realça cada composição do chef Alberto Landgraf.
Lembro do olhete com vinagrete de alga e pinoles tostados, que ganhou uma generosa colher de caviar Osietra italiano…
Tínhamos o menu à mesa, sabíamos o que viria pela frente, num processo de tensão e relaxamento que transforma uma refeição em uma peça de arte: estética, equilíbrio, surpresa, cadência, andamento. Poderíamos estar falando de teatro, de música, de pintura… Mas é comida, e apenas comida. Com tempero de genialidade.
Em seguida vieram outras duas receitas com base no equilíbrio de três elementos. Primeiro, abobrinha, barriga de porco e batata-doce.
Antes do café, um Porto sempre vai bem, certo? Sim, ainda mais um como este Quinta do Infantado (olhe a linda cor). Um Tawny 10 anos desses que são do nível dos bons 20 anos. Vale aqui destacar o serviço de vinhos pilotado pelo sommelier Leo Silveira, ex-Aprazível, ao lado de Laís Aoki, que o chef trouxe de São Paulo. Uma dupla que trabalha em perfeita sintonia. Me impressionou. A escolha dos rótulos, o serviço, a limpeza das taças, a discrição, e a explicação dos vinhos.
Posso falar uma última coisa? O lugar também é lindo, incluindo as mesas, a louça, as paredes de tijolo aparente em contraste com muito elementos de aço e metais, incluindo uma parede de adegas, e a cozinha aberta. E ainda tem um aquário, com moluscos vivos. Chega.
*Texto adaptado do Instagram @brunoagostinifoto
Oteque: Rua Conde de Irajá 581, Botafogo Tel. (21) 3486-5758. De ter. a sáb, das 19h30 às 23h30 (necessário reservar). www.oteque.com O menu custa R$ 285 (são duas propostas de harmonização: a R$ 175 e R$ 335).