QUERO MEUS RINS DE VOLTA!

Língua com purê e dois ovos: de volta ao menu da Casa Urich - Foto de divulgação / Tomás Rangel©
Língua com purê e dois ovos: de volta ao menu da Casa Urich – Foto de divulgação / Tomás Rangel©

Hoje o Joaquim Ferreira dos Santos, um dos melhores textos do jornalismo brasileiro, cronista que tira poesia de pedra, autoridade em Rio de Janeiro, e por consequência em botequins, destaca o retorno da língua ao menu regular da casa Urich (o que também me fez escrever uma reportagem: para ler, clique aqui).

LEIA A CRÔNICA (exclusivo para assinantes d”O Globo): Os cardápios contam a História do Rio e precisam ser preservados

Ele diz, com sabedoria, que se fosse editor do jornal colocaria a notícia, que não passou de rodapé, na primeira página, como manchete: “A língua voltou ao cardápio da Casa Urich!”, assim, como feliz exclamação.

“Os cardápios dos restaurantes são uma espécie de escritura sagrada da cidade, versículos em torno dos quais giram comportamentos, culturas, personalidades e memórias felizes da aldeia. Deviam ser textos imexíveis, cláusulas pétreas que ajudaram a erigir a civilização ao redor. Somos o que comemos. A dobradinha à moda do Penafiel na Senhor dos Passos, o cabrito que o publicitário Armando Strozenberg classificou de divino do 28 na Central do Brasil, a torta sacrapantina da Cantina Sorrento do Leme, o labskaus do Ficha na Teófilo Otoni, o sarrabulho da Lisboeta de frente para as cotias do Campo de Santana e a batida de amendoim do Tangará, da Cinelândia, porque somos também o que bebemos.”, escreveu o amigo.

Na sua saudosa lista faltaram algumas dessas cláusulas pétreas que se extinguiram. Caso dos rins ao molho Madeira, que eram servidos no Nova Capela, e hoje não mais. Foi uma grande perda, ainda que o restaurante continue vivo, agora sob a batuta de Antônio Rodrigues, do Belmonte.

Nos meus tempos de O Globo tive a sorte de me aproximar do Joaquim, com quem dividi a mesa algumas vezes. Comemos cabeça de cherne no Escondidinho, no Beco dos Barbeiros, e carne-de-sol com macaxeira no Chapéu de Couro, em Bonsucesso, entre outras incursões botequeiras – como quando fomos traçar o PF na Adega Pérola, nosso mais recente encontro.

Certo dia, ele mandou e-mail, dizendo algo assim:

“Está no jornal? Vamos comer rins no Nova Capela”.

Convite irrecusável.

E, assim, fomos nós, caminhando, da Rua Irineu Marinho até a Mem de Sá, para saciar a vontade, esse imenso prazer que é comer.

Os pedaços, tenros, foram bem preparados, sem o sabor marcante e desagradável que pode caracterizar a iguaria, se não for devidamente escaldada, entre outros segredos de seu cozimento. O molho Madeira traz aquele paladar acolhedor, tradição carioca, com untuosidade colagenosa, sabor marcante e inconfundível. A guarnição era purê de batata, muito adequada. Gotas de pimenta ajudam o conjunto. Foi uma tarde feliz, dessas que não me esqueço.

Quando voltei recentemente com vontade de repetir o prato lamentei não ter mais, e acabei comendo croquete de cordeiro, e pastel com o mesmo recheio (pra quem não sabe, o “cabrito” do Nova Capela sempre foi cordeiro – pelo menos há uns 25 anos é).

Estou há tempos com vontade de comer rins. Vou ter que viajar para isso? Lamento ainda o fechamento do Le Vin de Ipanema, onde sempre fui feliz apreciando o repertório de receitas clássicas francesas que encontrávamos ali. Saudades. Era um lugar onde eu podia me sentar, pedir uma garrafa de Chinon para escoltar os ‘rognons de veau à la moutarde”, ou seja, rins de vitelo ao molho de mostarda. Eram momentos sublimes.

“Rueda de Achuras”: riñones, molleja, morcilla, chinchulines e chorizo (linguiça) – Foto de Bruno Agostini®
“Rueda de Achuras”: riñones, molleja, morcilla, chinchulines e chorizo (linguiça) – Foto de Bruno Agostini®

Mas, nem tudo está perdido. Quando eu quiser comer rins eu os encontro no restaurante Corrientes 348, ótima parrilla, que faz jus à tradição platense, e serve um riñones na brasa. Podemos pedir uma porção só com elas, ou a minha sugestão, a chamada “Rueda de Achuras”, que tem ainda molleja, morcilla, chinchulines e chorizo (linguiça). Amém!

Ainda assim, torço pelo dia em que os jornais escrevam na capa, ou menos em notas discretas: “Os rins ao Madeira voltaram ao cardápio do Nova Capela!”.

SERVIÇO
Casa Urich: Rua São José 50, Centro. De segunda a sexta, das 12h às 21h. Tel.: 21-99975-1247. Instagram: @casaurich
Corrientes 348: Av. Infante Dom Henrique s/nº, Glória. Tel.: 2557-4027.
Rio Design Barra, Av. das Américas 7777, Barra da Tijuca. Tel.: 3648-7008. Instagram: @corrientes348br

 

 

 

 

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