Hoje, sem falar nos clássicos, eternos e imortais, o que mais me fascina na gastronomia é perceber a identidade de cada ingrediente. É ver a maneira como cada elemento é usado no prato, a forma como se relaciona com os demais componentes da receita, como fica o equilíbrio do conjunto, e de que forma ele nos encontra. É um passeio pelos sabores do Brasil, como eles mesmos definem.
A grandeza da simplicidade, onde quero encontrar uma combinação que surpreenda e encante, a começar pelos olhos. Quando o perfume também contribuiu para isso, tudo se torna ainda mais sedutor e fascinante. O cuidado com a louça e a estética reforçam isso ainda mais. Estar em local aprazível é opcional, mas conta pontos – tanto melhor se estiver em ambiente rural, desses que nos fazem esquecer da vida. Com boa música, então… pacote completo para a felicidade, e a descontração.
LEIA MAIS: Angá Ateliê Culinário: a pureza da cozinha em estado de arte
Pois o Angá se enquadra nisso tudo, e assim se encaixa como poucos em minhas preferências gastronômicas. O restaurante me entrega exatamente aquilo o que busco na comida: sabor, verdade, beleza.
Lydia Gonzalez e Bruno Sobreira trabalham numa sintonia plena, que encontramos facilmente em cada prato que nos servem.
UM PASSEIO PELOS SABORES DO BRASIL
A Lydia chega, sorridente, trazendo a garrafa de Cão Perdigueiro, de boas-vindas.
Logo em seguida chega o couvert da casa, também chamado “Um passeio pelos sabores do Brasil”, totalmente autoexplicativo.
Sempre chamam a atenção os pães de fermentação lenta, e natural. Havia ainda uma espécie de pizza branca, de sabor untuoso e muito crocante: era de polvilho com linhaça, uma deliciosa massa fina e crocante – que dá vontade de comer por toda a vida. Os pães são tão bons que bastariam para formar excelente couvert… sempre podem variar. Na última visita eram pães de canela, e uma focaccia. Nada disso precisaria de complementos.
Mas, ainda havia no serviço em linda louça o fenomenal queijo tulha de 12 meses, servido com doce de mamão. Uma quenelle de patê de fígado, muito do delicioso, e uma criação inacreditável: uma manteiga noisette (queimada) com pimenta murupi fermentada no mel. Loucura. Uma manteiga cujo sabor vou lembrar pra sempre.
A GRANDEZA DA SIMPLICIDADE
– Simples assim – resume a chef.
Mas, não é bem assim… É um couvert fora da curva, que tem tudo o que precisamos para começar uma refeição, mas cada um dos elementos tem o toque da chef. Merece ser tombado, mas a Lydia gosta de mexer no menu. E logo, logo ela vai trocar o cardápio, que muda ao sabor das estações, quatro vezes por ano.
No meu dia, depois desse prelúdio, foi servido um quinteto formado por coalhada, que fica escondida sob as finas fatias de peixe cru, com farinha pubada, torresmo e farofa, conjunto finalizado com folhinhas da horta e gomos de tangerina.
Em seguida, chega o fazzoletti, uma massa larga, cujo nome significa lança, em italiano. Feita na casa, é claro, vem adornada com cogumelo e pinhão, com folhas tostadas no braseiro que arde na cozinha, finalizando alguns pratos, e ervas frescas. Uma delicadeza, que apreciei tendo na taça o Alberto, tinto também delicado, da Casa Ágora, delicinha de vinho.
O baile continua, com a montagem que traz uma espécie de mil-folhas de mandioca, um naco de costela com quiabo e mariola.
A VIDA É BELA NO ANGÁ
– Essa é a nossa versão da vaca atolada. A gente faz a carne com muita paciência, na técnica do pinga e frita – explica a chef.
Nos aproximamos do fim, através do sorbet de limão galego com suspiro de rosa mariquinha, aquela pequenina, combinada com um toque de azeite. Uma das mais perfeitas ideias mais um pré-desert, simplesmente perfeito para limpar o paladar.
Necessário. Só assim para percebermos todas as nuances da sobremesa, trio maravilha, formação surpreendente, um trio formado por cacau da Bahia cogumelo e quebra-queixo, em versão desconstruída. Pois, sim. Havia lâminas de coco, uns elementos crocantes, uma coisa, novamente espetáculo da delicadeza.
Nunca dispense o que, porque além de ser delicioso, vem em linda louça, com docinhos de encerramento. Uma colher de doce de leite, e um quebra-queixo, desta vez, de verdade.
A vida é bela no Angá. Um passeio pelos sabores do Brasil combinando originalidade e delicadeza, sabor e pureza… a arte da mesa.
LEIA MAIS: Lydia Gonzalez culmina no Angá uma linda trajetória de 20 anos de cozinha
SERVIÇO
Angá Ateliê Culinário: Rua Argentina 393, Nogueira, Petrópolis. O restaurante funciona apenas com reservas. Tel.: (24) 98163-1455. Instagram: @angaatelieculinario