É tênue a linha que separa uma típica tasca portuguesa de um boteco carioca da gema.
O que se come é praticamente o mesmo, com naturais variações.
São sardinhas fritas e bolinhos e pataniscas de bacalhau. São broas, azeitonas e queijinhos, enchidos ou embutidos. Tremoços. Fritadas. Leitões. Açordas, chanfanas e púcaras. Há percebes e caracóis. Lampreias. Muito molho pardo. Alheiras na bagaceira.
Grelos parecem um tipo brócolis, mas não são. Prego é um bifinho que serve de recheio de sanduíche. Punheta é só bacalhau desfiado. Secreto todo mundo sabe de que se trata: é carne de porco, uma área nobre da barriga. Sapateira é um siri gigante enquanto farinheira é um embutido de porco.
Barriga de Freira e Pata de veado são doces (de ovos, claro). E sopa de pedra não é bem o que o nome sugere.
Para beber, imperiais são chopes. E há ainda aguardentes. E vinhos. Amarguinhas. Ginjinhas. Vinho Verde, mas tinto, na malga.
Empadas… Aqui fazemos de camarão, palmito e frango. Em Portugal, no Alentejo, eu sugiro de lebre e, lá pelas Beiras, a melhor pedida seria de perdiz selvagem. Isso, claro, se for outono.
Portugal é uma delícia em outubro, novembro. O perfume das castanhas. Os gordos pratos sazonais, de caças, cogumelos, peixes rechonchudos e porcos pretos no auge do peso, e do sabor. As brumas acolhedoras que encobrem as serras acomodam as mais finas iguarias da temporada. Mas isso é outro assunto, voltemos aos balcões cariocas e alfacinhas e do Norte português.
Lá, risoto de camarão talvez fosse chamado de malandrinho de carabineiros, se usasse o crustáceo que tem o mais lindo tom de vermelho que eu conheço – e das mais tenras, saborosas e ligeiramente adocicadas “carnes” que já provei. Um tirombaço! De carabina.
Iscas de fígado à lisboeta são um clássico carioca.
Dobrada à moda do Porto, que não se pode comer fria; cozido à portuguesa, servido no Rio de modo imbatível porque tem itens brasileiros agregados, como mandioca, banana e o pirão; tornedor ao Madeira, homenagem – e em tese
feito com ele – a um vinho que leva o nome de sua ilha natal.
O DNA de um botequim carioca é português. Totalmente. Mais especificamente, minhota.
Quando penso numa birosca tradicional do Rio eu imediatamente viajo até Portugal.
Encontro azulejos azuis, altares de São Jorge e memórias.
A região do Minho foi quem enviou ao Rio um punhado de imigrantes com vocação para trabalhar com hospitalidade. Também chegou gente de outras vilas do Norte, da Serra da Estrela, das Beiras e de Trás-os-Montes. Mas a grande maioria veio do Minho. O resto é galego.
Muitos desses bares reconhecem isso no nome. Começando logo por um dos mais antigos, inaugurado ainda no século 19, nos tempos do Império: é de 1884.
Temos o saudoso Penafiel, o bar Flor de Tâmega, que mora nos corações tijucanos, Em Teresópolis havia a Camponesa da Beira, e até hoje me delicio com os Defumados Trasmontanos, com sua produção artesanal de embutidos e carnes curadas.
Coincidência ou não, no último ano abriram as portas, no Leblon, três casas que resgatam e modernizam essa tradição. Que é tão carioca e que tem raízes tão lusitanas. Por ordem de chegada, a Tasca Miúda, o Boteco (e Galeto) Rainha e a Sardinha Taberna Portuguesa.
Para que este post não fique muito grande ele se torna só um aperitivo.
Nas próximas semanas eu escrevo mais sobre cada um desses três lugares, sempre às terças. Que logo nas minhas primeiras visitas caíram nas minhas graças. Foi amor à primeira vista. Pelas três casas. São botecos onde gosto de estar, comer, conversar e beber. Onde sempre vou voltar. Que recomendo.
Para ler os posts, clique nos links abaixo:
– A tasca Miúda é um grande lugar
– Boteco e Galeto Rainha, e o melhor polvo do MEU MUNDO!
– Sardinha Taberna Portuguesa, uma casa portuguesa, com certeza
4 commentários
Que delícia de post. Não vejo a hora de ler as sequências!
Obrigado, meu amigo! Saudades! Grande abraço!!!
Parabéns pelo seu trabalho, estava a procurar um conteúdo assim, já algum tempo. Continue.
Obrigado