Retrato de um Prato: badejo à belle meunière, clássico universal, especialidade carioca

O bedejo grelhado coberto belo molho, com suas guarnições mais usuais – Foto de Bruno Agostini®

Outro dia, caminhando em uma feira livre em Ipanema eu passei pela área das peixarias. Delas exala um odor ruim, de pescados já deteriorados. Meio nojento. Não sei porque, mas exatamente neste dia eu me dei conta de uma coisa: fiquei dos meus quatro ou cinco anos até os nove ou dez sem comer peixes ou frutos do mar, e percebi que foi por causa desse cheiro, que sentia quando ia às feiras com alguém da família.

Mas, insisti neste preconceito, porque todo mundo falava tão bem de linguados, badejos, camarões, lagostas, polvos… Provei um linguado grelhado, e foi amor à primeira vista, em um restaurante italiano de Ipanema, chamado Il Capo, que meu avô gostava muito. Depois, veio o badejo, o cherne, e gostei ainda mais – este, no Le Coin, no Leblon, onde meu pai ia todos os domingos.
Nessa época eu gostava de pedir cherne à belle meunière, receita clássica da gastronomia mundial, e muito popular nos restaurantes tradicionais do Rio, de linhagem ibérica, seja da Galícia, seja do Norte de Portugal (Minho, sobretudo), duas regiões especializadas em peixes e frutos do mar, favorecidas que são pela gelada costa do Atlântico Norte, generosa em pescados de qualidade imensa.
Belle meunière é o molho, feito de manteiga, camarões, cogumelos e alcaparras, perfeito adereço para uma bela posta ou filé de peixe, sobretudo os de carne branca, mais gorda, como badejo e linguado, os meus preferidos para essa receita.

Há três semanas fiz uma pequena cirurgia na perna, e deveria evitar andar muito, e ficar de pé. Mas o médico liberou ir a restaurantes, desde que deixasse a perna levantada, apoiada sobre a cadeira.
Pelo menos isso.
Pensei, ao voltar para casa, no dia seguinte: onde ir jantar?
Na hora veio a resposta: vou À Marisqueira, comer badejo à belle meunière, para ativar essas memórias infantis, das minhas mais antigas memórias gastronômicas.
Levei uma garrafa de Compromisso, da Quinta da Lixa, já geladinha. Era uma noite quente. Entrei no salão refrigerado, e logo o querido Assis veio me saudar. Com quase 50 anos de casa (A Marisqueira foi fundada em 1952: fez setenta anos em 2022!), ele hoje é sócio, e foi o responsável pela reforma e reinauguração deste restaurante histórico do Rio, com repertório de pratos portugueses, com destaque para os peixes e frutos do mar, como o nome já indica.
Já havia prometido a ele voltar para pedir esse prato. Foi mais cedo do que imaginei.
Veio uma posta bem grelhada, com o molho separadamente, além de arroz de brócolis e batatas, tudo simples e delicioso. Como eu precisava naquela noite.
E, aí, fiquei lembrando das idas ao Il Capo, ao Le Coin, ao Satyricon e – pasmem – também à Plataforma, onde em vez de picanha eu gostava de pedir espetada de camarão VG: meu pai consentia, mas reclamava, do preço, e ainda destacava que ali era uma churrascaria, e a especialidade eram as carnes. Mas… eu já havia sido fisgado pelos pescados…
E, agora, me deu vontade sabe de quê? De comer belle meunière no Satyricon, porque lá eu sei que também tem.
2 commentários
  1. Boa tarde Bruno. Quando eu vi a foto, já sabia que era na Marisqueira. Por que? Por causa do arroz com brócolis. Antes de fazer minha humilde crítica, considero o arroz de brócolis da Marisqueira, junto com o do Rancho Portugues, do Adegão Portugues de São Cristóvão e o do Rio Minho, os melhores do Rio. Verdade que ainda não comi o do Gajos d’Ouro, que deve ser muito bom. E tem mais. Há muitos anos atrás, foi lá, com um antigo garçom da Marisqueira, que aprendi a fazer o arroz com brócolis identico ao deles. E, assim como voce, adoro a Marisqueira. Anos e anos comendo lá as melhores lulas com arroz e brocolis da minha vida. Hoje não as como mais, pois trocaram o fornecedor antes dela ser vendida, anos atrás, e agora elas são congeladas e sem a pele que tanto apreciava. Mas o que está acontecendo na Marisqueira? Embora o Assis jure de pés juntos, que sempre foi assim, não é verdade. Nunca pratos como bacalhau a Mario Soares ou badejo a Belle Meunière vieram com arroz de brócolis. A verdade é que com os insumos caros, diminuiu o tamanho do filé de badejo. Tambem diminuiu a quantidade de bacalhau. Não digo que esteja mal servido. Não. Mas diminuiu. O arroz de brócolis vem para saciar o apetite dos comensais. O molho francês, Meunière, vem com manteiga, sal, limão e salsinha picada. O Belle Meunière vem com os mesmos ingredientes acima mais alcaparras. Camarões são uma liberdade poética brasileira. Cogumelos não estão em nenhuma das 2 receitas. Para terminar, Bruno, na minha primeira ida à Marisqueira pós-reforma, fiquei na dúvida se pedia o bacalhau a Mario Soares ou o taco de bacalhau a Portuguesa, já que neste último, a casa mantem a tradição de servir o vinagre de vinho tinto feito na casa. E que é uma delicia. Mas resolvi pedir à Mario Soares mesmo, meia porção. Estava sozinho. Veio muito bem servido. Repeti. Sobrou, Levei para Teresópolis numa embalagem muito bem fechada. Não toquei no arroz com brócolis, mas levei para viagem em outra embalagem. Duas semanas depois volto lá para jantar com meus compadres mas o genro deles. Somos muito bem recebidos pelo Assis e pedimos o mesmo Mario Soares mas já a porção completa. Pedimos antes alheiras e bolinhos de bacalhau. Só o genro dos meus compadres pediu filé a milanesa. Pois faltou bacalhau e tivemos de comer o arroz de brócolis tambem, para não sairmos com fome. Pelo preço do Mario Soares, 310,00, e pela meia porção que havia comido 2 semanas antes, era para vir mais bem servido. Agora é voltar para matar a saudade do bacalhau à Portuguesa com aquele vinagre especial

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