– No Rio não tem ninguém que consegue fazer uma culinária raiz italiana de verdade como ele. Ele não faz mistura, entre a culinária brasileira e italiana, como às vezes acontece Ele consegue apresentar o seu país ao Brasil, trazendo a tradição culinária atrás de cada prato. Consegue trazer os sabores, o que muitas vezes é difícil recriar os sabores sem ingredientes principais da Itália. Ele tenta, e muitas vezes consegue, recriar os sabores dos pratos tradicionais da Itália. Ele é da Úmbria, uma região no centro do país, onde a comida é baseada muito em caças, em produtos da terra, como javali, muitos legumes e a famosa trufa negra de Norcia. Tem alguns frios importantes também, como queijos e embutidos. Pratos bem cheios, carregados de sabores. Obviamente estamos falando de uma culinária bem tradicional, mas acredito que realmente não tem ninguém no Rio que faz esse tipo de culinária, raiz. Ele conhece a história, o prato em si, original. Ele não mascara o prato para agradar o público, colocando outros sabores. Ele faz a verdadeira carbonara, a verdadeira amatriciana… Faz a famosa escafada, que ninguém conhece, que à base de favas e guanciale, que ele usa o verdadeiro, não é pancetta ou bacon. Isso reflete muito o que ele tem como missão. É isso o que o cozinheiro tem que fazer. Ele chegou ao Brasil, primeiro trabalhando na Embaixada da Itália, em Brasília, e depois chegou ao Rio, sempre com a missão, de trazer ao Brasil a verdadeira culinária italiana, porque acredito que cada chef tem a sua missão. A minha missão, por exemplo, foi chegar ao Brasil, em 2016, e fazer uma coisa diferente, que foi inovar a culinária italiana, mas sem perder o escopo de cada prato e da tradição. Por isso o Renato, que é muito tradicional, segue a escola dele, e na minha opinião, no Rio ninguém faz a culinária tradicional com ele. Claro que isso leva muitos anos, lava tempo. Ele foi estudar, experimentar. Indo nas trattorias, nas osterias, nos restaurantes típicos, para depois ele colocar no prato. Obviamente a culinária dele passeia pela Itália toda, não só pela Úmbria, a região dele. Porque ele consegue fazer muito bem, consegue recriar os pratos clássicos da Itália, das ilhas, como a Sicília e a Sardenha, até chegar no Norte do país. Uma culinária confortável, muito bem feita, e reflete muito bem a culinária italiana. Por isso, quando eu quero comida italiana raiz italiana de verdade eu vou comer no Alloro.
Quem diz isso, sobre o chef Renato Ialenti, não sou eu, mas ninguém menos do que Nello Cassese, que acaba de confirmar pelo segundo ano consecutivo a sua estrela Michelin, à frente do Cipriani, no Copacabana Palace, e de toda a operação de alimentos e bebidas do hotel, que reabriu, com seus restaurantes, no começo do mês.
Eu estou com ele, e a cozinha do Renato Ialenti de fato me conforta e me emociona, e me faz viajar à Itália. Tenho a sorte de acompanhar o seu trabalho de perto, e de garfo e faca em punhos, há mais de seis anos, como escrevo logo abaixo, reproduzindo o post que fiz no Instagram na última quinta, quando tive um almoço sublime no Alloro al Miramar.
Começamos com espumantes na piscina, e sugiro que se faça o mesmo, seja de dia, seja de noite. A vista é das mais espetaculares, quase debruçada sobre o Forte, e com uma angulação que valoriza as linhas arredondadas da praia mais famosa do Brasil, com o Pão de Açúcar ao fundo.
Não escolhi nenhum prato, deixei o menu nas mãos do chef, como faço quando estou diante de um que confio, e no caso do Renato, faço isso de olhos fechados, e nunca me decepciono. Descemos para o térreo, e eu comi uns três grissini, porque é difícil parar de mordiscar este biscoitinho-palito.
Primeiro passo: baccalà mantecato con polenta grigliata e fonduta di parmigiano. Tão bom quanto no Vêneto… Ou até melhor. Como eu amo esse prato, tão simples quanto delicioso, com esse bacalhau cremoso e amanteigado disposto sobre polenta grelhada, e com um molho de raspar o prato com o pão.
Depois, ciriole con funghi, asparagi e gamberi. Ou seja, uma massa caseira e rústica, grossa, com cogumelos, aspargos e camarão, além de tomate.
Daí, eu quase fui às lágrimas, como o gnocchi al ragù di agnello. Que molho fabuloso! Não morra sem provar isso. Eu me senti no meio das montanhas da Itália, numa noite fria de outono, mesmo estando numa tarde quente da primavera carioca. A comida faz isso com a gente, leva a delírios do tipo… Loucura total, e posso dizer: das melhores massas da cidade. Emocionante.
Então, vem um ossobuco di vitello con pure allo zafferano. Eu, que voltando ao manicômio da comida, assumo: sou maluco por ossobuco de vitelo. Quando ele vem sobre purê de baroa com o seu amarelo-ouro e sabor reforçados pelo açafrão a doideira é ainda maior. Para agravar ainda mais, no melhor sentido, o meu quadro clínico, ainda temos um toque cítrico, saboroso e perfumado, através de raspas de limão siciliano, além de um toque discreto de alici e salsinha.
Fechamos com um tiramisù que considero o melhor do Rio, e uma crema bruciata al frutto della passione, que vem a ser um creme brûlée ao maracujá; e pnna cotta di cocco con salsa tropicale – acho que não precisa traduzir.
Para o café, uma grappa das boas, que estava fora do script, mas fiz questão de pedir. Porque uma refeição italiana merece terminar com este destilado.
ALLORO AL MIRAMAR: DÁ VONTADE DE PEDIR TUDO DO MENU DO CHEF IALENTI*
Desde que o conheci no divertido bar Italioca, um bar ítalo-carioca, com pratos da Bota e samba de trilha sonora, eu admiro o chef Renato Ialenti e sua mulher, Márcia. Primeiro pelas pessoas que são, que é o que realmente importa, segundo pelo trabalho que fazem – ela na cozinha e ela no salão.
Nas mesas desse boteco copacabanense vivi noites memoráveis. Nunca esqueci da porchetta e da carbonara – duas comidas simples, porém de difícil execução para se tornarem impecáveis, como foi o caso.
Depois de breve passagem no L’Ulivo, também em Copacabana (novamente tive incrível experiência, com um prato igualmente simples, mas marcante: favas verdes com guaciale no molho de tomate), o chef italiano da região da Úmbria, assumiu as panelas do Alloro al Miramar, neste histórico e renovado hotel, desta rede carioca. Advinha onde? Copacabana – desta vez na praia, com parede envidraçada que traz o mar e o movimentado calçadão para dentro do restaurante.
Com cardápio novo e serviço de delivery (primeiro de um cinco estrelas no Rio) com outra novidade, ele continua servindo o que sabe fazer de melhor. Cozinha italiana, marcando pratos clássicos com algumas pitadas autorais. Sempre apresentando ingredientes autênticos e de alta qualidade, sem os quais não se prepara cozinha italiana original, dependente da matéria-prima como talvez nenhuma outra.
Basta folhear o menu pra dar vontade de pedir tudo. De cara eu gosto da burrata alla puttanesca (este queijo cremoso que é pura ternura, com azeitonas pretas, alcaparras, alici e molho de tomate). Outra sugestão irresistível? Entre as suas criações, instigante é boa definição o filé de linguado em crosta de pistache e bottarga com legumes grelhados (amo esta castanha verde e as ovas de tainha curadas, mas nunca as vi juntas em uma receita). Para a sobremesa, chocolate sempre é tentação: crocante de cacau e texturas de cerejas. Esses são novidades.
Dos pratos antigos alguns já são clássicos do Renato. Dos que testei e aprovei, com louvor (link na bio sobre um post sobre a casa), estão as entradas “polipo e patate”, de polvo e batata, e o baccalá mantecato, um bacalhau desfiado e amanteigado, servido com polenta grelhada, além do vitello tonnato e uma deliciosa combinação de figo ao Porto, bresaola e mascarpone. Entre os pratos, o tonnarelli cacio e pepe, o tagliatelle alla norcina, massa com linguiça toscana, cogumelos e trufa negra, estão entre as massas que recomendo com força.
Para encerrar, um das melhores versões de tiramiú da cidade.
Bravo!
* Post publicado no Instagram, na quinta passada.
SERVIÇO
Alloro al Miramar: Miramar Hotel By Windsor, Av. Atlântica 3668, Copacabana. Tel. 2195-6213. alloroalmiramar.com.br
E MAIS:
Alloro al Miramar – Um passeio pela cozinha italiana tradicional – por Renato Ialenti
1 comentário
Bom dia Bruno. Adorei, como sempre, esse texto sobre o Renato. Mas eu conheci Renato e Marcia antes do Italioca, num pequeno restaurante onde hoje é o Haru. Não saía de lá. Comida raiz e preços muito baratos. Depois o acompanhei no Italioca e no L’ulivo. No Alloro fui uma vez jantar com um casal de amigos. Gostei bastante. Infelizmente ele não estava, e infelizmente achei muito caro, não dá para ir no dia a dia como eu fazia na época da rua Raimundo Corrêa. Quanto ao que escreveu o Nello assino embaixo. Toda regra tem sua exceção e no caso do Renato veja que ele abrasileirou sim o puré do ossobuco, já que batata baroa não existe na Itália. O bacallá mantecato típico de Veneza é servido com polenta branca e não leva manteiga, é emulsionado no azeite, pelo menos na receita original. O molho de parmigiano deve enriquecer o prato, mas também não existe na receita original. Contudo esse molho não é um abrasileiramento. Mas o purê é. Ou seja, o Nello está certo quando diz que Renato é.fiel às tradições italianas, mas toda regra tem exceção. Por falar no Nelo, o que aconteceu ao Francesco Carli? Saiu do Copacabana Palace?