Bacalhau de Páscoa: onde comer versões espanholas e italianas no Rio?

A tortilla do Venga! pode ser servida com ou sem bacalhau – Foto de Bruno Agostini©

Ainda o bacalhau, parte 2 – os pratos da Espanha e da Itália. Pior é que fiquei com vontade de fazer uma lista dos meus bolinhos preferidos. Na próxima sexta eu faço.

Uma das variantes da tortilla, clássico espanhol, é com recheio de bacalhau. Nasceram um para o outro o ovo, a batata, a cebola e o bacalhau. Outra versão sensacional da Espanha é o bacalao al pil pil, cujo preparo parece simples, mas não é: a grande jogada aqui é o molho, uma emulsão natural do azeite perfumado com alho com a própria gelatina do bacalhau.

O Venga!, em tempos de pandemia, reduziu um pouco o cardápio. Mas nele ainda está em cartaz a tortilla, que pode ser pedida com recheio de bacalhau ou não. Altíssimo nível.

O pil pil do Venga!: torcemos para voltar logo ao menu – Foto de Bruno Agostini©

Já o excelente bacalao al pil pil, que era servido na casa, está por enquanto suspenso (faz sentido, o molho é delicado, não deve viajar bem).

-A gente deve voltar a servir depois que normalizar tudo – diz o sócio, Fernando Kaplan.

Tentei lembrar aqui de algum outro lugar que sirva, ou servia, este prato no Rio, e só me ocorreu mesmo o Fim de Tarde, no Centro – onde também podemos pedir impecáveis tortillas de bacalhau (ou chorizo – peça para misturar os dois que fica incrível, vai por mim).

Aliás, este é um discreto recanto que eu gosto muito, nunca comi nada equivocado por lá. É um restaurante desses que eu chamo de clássicos cariocas, sempre com administração familiar, de portugueses e/ou espanhóis. Fazem bacalhau muito bem, e nessa lista eu coloco lugares como o Málaga, casa-irmã do Fim de Tarde, dos mesmos donos; o Degrau e o Alvaro’s, no Leblon (citaria o Le Coin, mas fechou), além de outros endereços mais voltados aos peixes e frutos do mar, como o Rio Minho, no Centro, e A Marisqueira, em Copacabana.

Isso para citar lugares que eu gosto, já fui (muitas vezes) e recomendo, porque há muitos outros na categoria, ainda que estejam em extinção desde os anos 1980, como o Shirley, no Leme – cliente desde criança, íamos com um amigo de meu pai, pescador – cuja a última visita, há muitos anos, me entristeceu porque achei  pequeno local de lindas lembranças um tanto decadente (parecia que ia fechar logo, mas isso tem uns 20 anos).

Sim, isso é uma finíssima polenta frita, no Agli Amici – Foto de Bruno Agostini©

Por fim, a Itália. Lá eu busco um prato cremoso, que é um clássico do Vêneto: o baccalà mantecato, tradicionalmente servido com polenta. Na cidade de Spilimbergo, no restaurante Agli Amici, da família do meu amigo, Stefano Zannier, há anos morando no Rio, eu comi a melhor entre todas as versões do prato. Além do bacalhau, cremoso e sabor na medida exata, havia uma fina lâmina de polenta frita, numa espessura que eu jamais tinha visto e nem voltei a ver. Um espetáculo. Surreal.

Tão bom quanto no Vêneto: baccalà mantecato de Renato Ialenti – Foto de Bruno Agostini©

No Rio poderemos brevemente encontrar uma versão igualmente muito boa, de um verdadeiro craque e autoridade quando o assunto é cozinha tradicional italiana: Renato Ialenti. Comi várias vezes a sua versão no Alloro al Miramar. Mas ele agora está no grupo Mamma Jamma, e certamente vai colocar ordem na cozinha porque é fera.

– Por enquanto não temos previsão de botar no menu atual, mas talvez mais para frente, no projeto Mamma Trattoria – diz o chef.

Perguntei ao Michele Petenzi, que o substituiu no Alloro, mas ele ainda não me respondeu. Espero que ele mantenha, porque não tenho dúvidas que ele manteria o nível do prato, como certamente vai manter o alto padrão da cozinha do restaurante no térreo do hotel Miramar, em Copacabana. Petenzi cozinha muito, e faz uma cozinha italiana que pode ser clássica e bem tradicionalista, mas com talento para também fazer receitas autorais.

Outra receita bem popular na Itália é o baccalà alla livornese, típica do litoral da Toscana, típico da cidade que lhe batiza, Livorno. O peixe é servido em molho de tomate com vinho branco e batata. Se bem preparado, é um prato comovente – bem interessante para os brasileiros, já que é um modo de preparo muito diferente do que estamos habituados.

Mas existe baccalà alla vicentina (bastante difundida também), alla napolitana, alla siciliana, alla fiorentina, alla lígure, alla romana, esta última uma receita típica do Natal, e também da Páscoa, bem parecida com alla livornese, mas ainda mais rica, preparada com pinoles e passas.

O bacalhau também pode fazer parte de adorável petisco típico da capital italiana, empanado e frito: o fritto di mare, servido pelas ruas da cidade, sempre com lula e camarão, para a gente comer feito pipoca, pingando limão siciliano. Soberbo.

Pensando bem aqui (ainda não havia notado isso), todas as receitas preferidas com bacalhau primam pela simplicidade, mas cada qual com os seus segredos. São em tese fáceis, mas a verdade é que fazer um bacalhau perfeito não é para qualquer um, seja em Portugal, na Espanha ou na Itália.

Acredite se quiser: para mim, o melhor bolinho de bacalhau do Rio é servido numa churrascaria, no caso, a Palace (faz parte do menu de Páscoa) – Foto de Bruno Agostini©

Aliás, pensando bem aqui, parte 2… No Rio come-se bacalhau melhor que em Portugal, nunca comi lá um que chegue ao nível dos melhores aqui. Falo isso com certeza e segurança. Bolinho de bacalhau, então… Nem se fala. Sem contar que por lá eles muitas vezes ficam expostos em vitrines no balcão, sendo servidos frios. Francamente… que pecado.

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