Na noite em que conheci o chef Nello Cassese, no final de 2016, eu tive um jantar memorável, que me fez de outras refeições igualmente inesquecíveis que estão em minha galeria particular de melhores de toda a vida. Quando ele foi até à mesa, ao final do menu em várias etapas, em disse algo assim:
– Chef, em primeiro lugar meus parabéns. Sua comida é extraordinária, e me fez lembrar alguns melhores restaurantes que eu já fui na Itália. O Arnolfo, na Toscana; o La Madia, na Sicília; o Pipero al Rex, em Roma; o La Cinzia e a Villa Crespi, no Piemonte. Seu dal plin me trouxe à memória o comi no Da Guido. Fiquei realmente impressionado. Sua cozinha é italiana, autoral e moderna . Bom ter você no Rio.
Enquanto eu listava os restaurantes eu notava em seu rosto um crescente ar de felicidade. Um sorriso no canto da boca ia aumentando conforme eu ia lembrando dos restaurantes. A partir daquele dia foram mais não sei quantas visitas. Rapidamente, de cabeça, eu me lembrei de 12 vezes. Foram almoço e jantares que me deixaram com uma convicção: o Cipriani é desde a chegada do Nello o melhor restaurante do Brasil. À cozinha impecável vão se somando atributos que tornam a experiência de comer ali em algo sem termos de comparação no país, pelo menos eu nunca vi nada igual.
É o ambiente elegante, é a vista para a emblemática piscina, é o serviço atento sem ser invasivo, e a carta de vinhos perfeitamente adequada ao cardápio, sob os cuidados de Ed Arruda, que há tantos anos ali virou o maior especialista em vinhos italianos entre os sommeliers do Rio.
– No Cipriani temos duas modalidades de harmonização, a tradicional, emque usamos vinhos Italianos. Normalmente são cinco vinhos, entre espumante, branco, rosé, tinto e doce (375 por pessoa). Temos também a harmonização Premium (R$ 700), em que usamos vinhos Italianos de alta gama – conta o Arruda.
Quem me conhece sabe, e meu sobrenome não nega: a cozinha italiana é – de longe – a minha preferida entre todas do mundo. Isso também ajuda a explicar porque sou tão seguro em dizer que o Cipriani é o melhor restaurante que já fui no Brasil. Minha opinião, apenas isso.
Nello é o chef com talento técnico que não vi em outro profissional do ramo. É rigoroso na escolha dos ingredientes e no preparo dos pratos. Conjuga em seu trabalho amor e respeito à cozinha italiana com uma seriedade que impressiona. E emociona. Foi lá que comi o melhor milanesa de toda a vida, um delírio em forma de prime rib, com distintas texturas (pena que não está mais no menu).
Seu “gelato della Nonna”, um sorvete que ele bete na mão e faz questão de ir à mesa servir, é algo de enternecer até o menos emotivo dos comensais. Ele joga nas 11 na cozinha, como se diz. Faz pães e panetones, e serve um potinho de grissini onde temos um crocante pane carasau, iguaria sarda de que tanto gosto, e também um grissini… de polenta. Sim, de polenta. Sabe trabalhar as carnes, com distintos pontos de cocção, e monta pratos que impressionam pela quantidade de técnicas empregadas em cada um.
Não deve ser fácil trabalhar numa cozinha que, a cada diz, tem mais de 100 preparos, com distintos ingredientes, e rigor na montagem. É craque nas massas e nos molhos, e seu repertório de receitas visita praticamente todas as regiões da Itália, buscando influência de Norte e Sul, do Tirreno ao Adriático, de “mare e monti”. Se inspira nos grandes cozinheiros do país, mas também traz à mesa suas raízes familiares de um napolitano (nasceu perto da cidade), o que aprendeu com a Nonna.
Sua pizza é excelente, e o molho de tomate, que comi em vários preparos, tem textura, sabor, acidez, açúcar, cor vívida, tudo em equilíbrio…
Por fim, é craque nas sobremesas, onde mostra talento e irreverência, e sua versão de um charuto comestível é pura alegria, beleza, sabor…
Quando comecei a teclar este texto eu queria na verdade escrever uma crônica sobre minha última refeição por lá, há cerca de 45 dias. Provei o menu Tradição-Inovação (R$ 450 por pessoa), um dos dois que o Cipriani hoje está servindo, só à noite, em dois horários (19h e 21h40): o outro é uma degustação que reúne os “Signature dishes” do chef (R$ 385), onde reluzem alguns meus velhos conhecidos, como o delicado carpaccio de wagyu; o ovo com parmigiano 36 meses e trufas; o del plin de frango á caçadora e o já citado charuto.
É possível, ainda, reservar a “Mesa do Chef” (R$ 950, com harmonização de vinhos), dentro da cozinha, uma EXPERIÊNCIA em caixa alta, que já tive a oportunidade de viver três ou quatro vezes (glória a Deus!): deve ser reservado com 48 horas de antecedência.
Quando gosto muito de uma refeição eu muitas vezes demoro para conseguir escrever. Parece fácil, mas para mim não é, traduzir em palavras algo tão complexo e profundo como é para mim uma comida de extrema excelência, que me emociona e toca o meu coração. Você pode não acreditar, mas já chorei algumas vezes à mesa. Posso ter epifanias comendo, e como se um bom prato fosse uma droga lisérgica, posso ter delírios de prazer. No Cipriani isso acontece. Em breve eu faço a resenha que estava programada para hoje, e coloco aqui o link.
Porque hoje só queria dizer uma coisa:
– Grazie mille, cuoco! Congratulazioni!!!
SERVIÇO
Cipriani: Belmond Copacabana Palace, Avenida Atlântica 1702, Copacabana. Tel. (21) 2548-7070. Site do restaurante. Menus.
E MAIS:
– Cozinha em Revista: o surreal bife à milanesa do Cipriani, e o almoço que passeia pela cozinha de rua da Itália
– Cozinha em Revista: uma noite de gala no Cipriani do chef Nello Cassese
– Nello Cassese fica no Copacabana Palace, e além do Cipriani agora é chef executivo de todo o hotel
– Cama e Mesa: o brunch do Copa – Uma tarde à beira da piscina, com cavaquinhas na brasa, drinques e espumantes
– Seleção Carioca: os melhores milanesas do Rio
– O Japão e a Itália: as melhores comidas do mundo!
– Cama e Mesa: a cozinha do Renato Ialenti, por Nello Cassese – “Tradição em cada prato”